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STF vota pela possibilidade de extinção da pena de multa em caso de hipossuficiência

O IDDD participou como amigo da corte no julgamento e defendeu que a pena de multa deixe de impedir a extinção do processo de quem já cumpriu a pena de prisão

No último dia 22, o STF formou maioria no julgamento da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 7032, que pedia a extinção do processo de um condenado após o cumprimento da pena de prisão, independentemente do pagamento da pena de multa. Seguindo o voto do relator Flávio Dino, a Corte avançou em questões importantes para corrigir injustiças causadas por essa sanção financeira, que gera ainda mais exclusão e estigmas para os/as sobreviventes do cárcere.

Na decisão, os Ministros seguem entendendo que o não pagamento da pena de multa ainda impede a extinção da punibilidade do condenado, exceto se for comprovada a impossibilidade da quitação — ainda que de forma parcelada. Na mesma decisão, os Ministros Dino e Cristiano Zanin inovaram ao permitir que o juiz, por si só, reconheça a hipossuficiência do apenado, caso os elementos dos autos lhe permitam presumir a falta de condições de pagar a multa.

A pena de multa é uma sanção financeira, aplicada individualmente ou acompanhada da pena privativa de liberdade ou restritiva de direitos, em condenações por tráfico de drogas e furto, por exemplo. Mesmo após cumprir o tempo de prisão, enquanto o valor não é quitado, a pena não é considerada cumprida e os direitos políticos seguem suspensos, impedindo o voto e gerando um efeito cascata sobre uma série de direitos básicos de cidadania.  

Sem certidão de quitação das obrigações eleitorais, a pessoa não pode regularizar seu CPF e, consequentemente, não tem como acessar programas assistenciais do governo; não pode se matricular em instituições de ensino superior; tomar posse em serviço público; abrir conta no banco; manter cobrança de serviços como fornecimento de energia elétrica em seu nome, o que acarreta dificuldades na comprovação de residência fixa; entre outras formalidades que são porta de entrada para direitos garantidos aos brasileiros.

Pena de Multa

A pena de multa até há poucos anos não fazia parte do dia a dia da execução penal brasileira. O cenário começou a mudar em 2019, com a alteração legislativa promovida pelo chamado Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), de autoria do ex-ministro da Justiça Sergio Moro, e pelas interpretações dos tribunais firmadas a partir de casos midiáticos, como o “Mensalão” e a “Lava-Jato”. 

Apesar de essas mudanças serem impulsionadas por fatos relacionados a crimes de corrupção, a pena de multa afetou principalmente milhares de famílias pobres, negras e periféricas. No estado de São Paulo, por exemplo, segundo dados publicados pela Agência Pública, em março de 2023, cerca de 208 mil execuções de pena de multa estavam em andamento, não importando o valor ou o patrimônio das pessoas condenadas (há relatos de penhora de aparelhos de televisão familiares ou até carroças). O mesmo levantamento apontava que em janeiro de 2020, eram apenas seis processos.  

Em seu argumento, o IDDD lembrou que “a ‘criminalidade econômica’ não é a ‘clientela’ que, usualmente, frequenta o sistema de justiça criminal. Pelo contrário, quem se senta nos bancos dos réus do sistema é o hipossuficiente”. Muito frequentemente os valores são impagáveis, sobretudo, para alguém que está tentando reconstruir a vida após sobreviver ao cárcere.

Essa decisão do STF é um passo importante no caminho para eliminar os efeitos mais evidentes das mudanças na legislação sobre pena de multa: o aprofundamento da vulnerabilidade e marginalização de egressos do sistema prisional.

Clique aqui para ler a peça de amicus curiae do IDDD na ADI 7032

Confira os memoriais enviados aos ministros do STF aqui.