
São Paulo, 22 de julho de 2015.
CARTA ABERTA AO SECRETÁRIO DE ADMINISTRAÇÃO PENITENCIÁRIA DO ESTADO DE SÃO PAULO
Senhor Secretário,
A Rede Justiça Criminal, coletivo formado por organizações da sociedade civil que lidam com sistema de justiça criminal e empenham-se no sentido de torná-lo mais justo e atento aos direitos e garantias fundamentais, escreve esta carta aberta para tratar da omissão de dados do Estado de São Paulo no Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias.
O Departamento Penitenciário Nacional (DEPEN) do Ministério da Justiça lançou recentemente o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN – junho de 2014¹ . Trata-se da consolidação de uma coleta de dados cuja metodologia, elaborada em parceria com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, pretendia contornar o grave déficit de informações sobre o sistema prisional brasileiro. No entanto, apesar de orientado ao desvelamento das condições de privação de liberdade no Brasil e ao conhecimento de sua população prisional, o relatório não permite outra conclusão, se não a de que os gestores e, em consequência, o país sabe muito pouco a respeito dos presos que custodia.
São patentes as insuficiências dos estabelecimentos e das 26 unidades federativas que se dispuseram ao preenchimento da plataforma de coleta de dados. Faltam informações, sobram inconsistências².
Muito mais grave, por outro lado, é a omissão de São Paulo, estado onde está custodiado mais de um terço da população prisional brasileira. Ao que consta do levantamento, apesar da prorrogação de prazos, de reiteradas solicitações e da adequação do formato de entrega de dados, os estabelecimentos penais sob a responsabilidade desta Secretaria de Administração Penitenciária falharam em fornecer as informações requeridas.
A tácita e inaceitável recusa de São Paulo ao preenchimento do instrumento de coleta, por significar a omissão de dados acerca de aproximadamente 220 mil pessoas³, obscurece o diagnóstico do país, distorce os resultados do levantamento, obstrui o acesso à informação, tolhe o debate público e inviabiliza o aperfeiçoamento da política penal paulista – e brasileira.
O desconhecimento, como sabido, é circunstância incompatível com a elaboração responsável de políticas públicas penais. A opacidade que dele resulta inviabiliza o controle social do desempenho e da coerência do poder público na implementação de suas decisões políticas. Lidamos nós, e todos os brasileiros, com as consequências de um sistema prisional que não nos é dado conhecer.
São Paulo não pode persistir contribuindo com a opacidade do sistema prisional, quando esta é uma das razões pelas quais se mantém calamitoso, deficitário e criminógeno. Em assim sendo, requeremos a vossa senhoria o envio imediato dos dados prisionais paulistas ao Departamento Penitenciário Nacional.
Cordialmente,
REDE JUSTIÇA CRIMINAL
¹ Documento lançado em 23 de junho de 2015. Disponível em <http://www.justica.gov.br/noticias/mj-divulgara-novo-relatorio-do-infopen-nesta-terca-feira/relatorio-depen-versao-web.pdf>, consultado em 29/06/2015.
² Sobre a falta de dados, observa-se, por exemplo, que os dados que permitem averiguar o fluxo de movimentação dos presos não incluem os estabelecimentos que abrigam mais da metade da população prisional brasileira, de modo que restou impossibilitado averiguar a quantidade de pessoas que experimentaram o encarceramento e suas consequências no primeiro semestre de 2014. Sobre as inconsistências, há exemplo, inclusive, apontado pelo relatório sobre a quantidade de servidores do sistema prisional no estado do Rio de Janeiro. Cf. Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias: INFOPEN – junho de 2014, pp. 46 e ss. e 76 e ss.
³ Segundo o Levantamento, com os dados que obteve mediante o acesso ao site da SAP-SP, a população prisional de São Paulo consiste de 219.053 pessoas. Vide Levantamento, p. 17.