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Audiências de custódia: a porta de entrada do sistema penitenciárioAudiências de custódia: a porta de entrada do sistema penitenciário

Tema prioritário de trabalho do IDDD há seis anos, o mecanismo volta ao centro do debate como uma das soluções para melhorar o sistema penitenciário

Diante dos recentes episódios de violência em unidades prisionais do país, as audiências de custódia ganharam destaque no debate e surgem como uma das medidas voltadas à melhoria do sistema penitenciário nacional. Isto porque, nas comarcas em que é adotada, essas audiências são a porta de entrada para o cárcere, com potencial de conter o número de prisões provisórias indevidas e, consequentemente, a superlotação carcerária, dois grandes problemas desse sistema.

Atento ao crescimento alarmante da população carcerária brasileira (167,32% entre 2000 e 2014, de acordo com o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – Infopen/Ministério da Justiça, com dados de dezembro/2014), especialmente o número de presos provisórios (40% do total), além de buscar adequar a legislação do país a normativas internacionais (como o Pacto de São José da Costa Rica, do qual o Brasil é signatário desde 1992), o Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD) trabalha desde 2011 pela implementação e regulamentação das audiências de custódia.

“Ao longo desses seis anos buscamos mostrar para toda a sociedade como as audiências de custódia configuram um mecanismo eficiente de combate ao uso excessivo da prisão provisória. Promovemos audiências públicas, desenvolvendo atividades de advocacy, debatemos junto a parlamentares a aprovação do projeto de lei que busca regulamentar a medida, e também participamos de uma audiência pública na Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, conta Hugo Leonardo, Vice-Presidente e diretor responsável pela temática dentro do IDDD.

Implementadas gradualmente nos estados a partir de fevereiro de 2015 por meio de um projeto promovido pelo IDDD, Conselho Nacional de Justiça e Ministério da Justiça, as audiências de custódia acontecem atualmente em todas as capitais brasileiras, porém sua expansão para outras comarcas está sendo lenta. De acordo com dados do CNJ, até o mês de dezembro de 2016 foram realizadas 174 mil audiências de custódia, sendo que 46% dos casos resultaram em liberdade. Na avaliação do Vice-Presidente IDDD, o número é positivo: “diante da predominância da lógica superencarceradora na nossa sociedade, o índice pode ser considerado bom e significativo, sinalizando um pequeno avanço para a diminuição do uso abusivo da prisão provisória”. Porém, ressalta: “o número poderia ser até maior e o seu impacto mais significativo caso essas audiências estivessem em funcionamento em todas as comarcas do país, nos sete dias da semana, durante todo o ano”, destaca Hugo. Em alguns lugares, como é o caso de São Paulo (estado com a maior população carcerária do país, com mais de 220 mil presos), as audiências de custódia ficam suspensas aos finais de semana e durante o recesso forense.

Em setembro de 2015, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) determinaram a implementação das audiências de custódia em todo o território nacional no prazo máximo de noventa dias, como uma das medidas necessárias para acabar com o estado de coisas inconstitucional em que se encontra o sistema penitenciário brasileiro. A mencionada decisão foi dada no julgamento da medida cautelar na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº 347, proposta pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

O IDDD, em parceria com a Rede Justiça Criminal (coletivo de organizações da sociedade civil que o IDDD integra) oficiou os tribunais de justiça estaduais em fevereiro de 2016, a fim de se fazer cumprir as regras previstas na Resolução nº 213 do CNJ – único dispositivo que regulamenta as audiências de custódia até o momento – e ressaltando a determinação do STF.  Dos 28 tribunais oficiados, apenas os estados de Rondônia, Piauí, Pernambuco, Paraná, Mato Grosso do Sul e Distrito Federal apresentaram respostas com informações sobre medidas adotadas para viabilizar a expansão dessas audiências, de forma adequada ao regulamento do CNJ. Posteriormente, no mês de abril, o Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo publicou a Resolução nº 740/2016, regulamentando a implementação gradativa das audiências nas comarcas do interior do estado.

Na avaliação de Isadora Fingermann, Diretora Executiva do IDDD, a expansão das audiências de custódia por todo o país, sua realização em tempo integral e a sua regulamentação por meio de lei, não serão suficientes para mudar estruturalmente o sistema de justiça criminal do país, tornando-o mais atento aos direitos e garantias fundamentais dos cidadãos, caso não exista, concomitantemente, uma transformação na cultura judiciária: “é urgente que os magistrados, enfim, passem a respeitar o princípio básico de nossa Constituição de que a liberdade é regra, afastando-se assim do clamor punitivista de parte da população”, ressalta. Para Hugo Leonardo, “as medidas alternativas precisam sair do esquecimento e ser incorporadas pelos juízes, já que constituem o tipo de punição adequada aos crimes sem violência, como furto e comercialização de drogas em pequenas quantidades, responsável por grande parte das prisões provisórias do país. Caso contrário, episódios como os que vem acontecendo em nossos presídios se tornarão cada dia mais uma rotina no sistema penitenciário brasileiro”, finaliza.

Histórico

Em conjunto com a Rede Justiça Criminal, o IDDD tem liderado desde 2011 diálogos e atividades de advocacy pela aprovação do projeto de lei que propõe alterar o Código de Processo Penal para instituir as audiências de custódia. Após ter tramitado por cinco anos no Senado Federal e enfim ser aprovado, no final do ano passado o texto chegou à Câmara dos Deputados, que decidiu apensar o projeto (PL nº 6.620/2016) ao projeto que trata da reforma do Código de Processo Penal (PL nº 8.045/2010). Portanto, a proposta passará por uma etapa extensa de análise, que adiará ainda mais a sua regulamentação. Na ocasião, o IDDD divulgou uma nota pública manifestando preocupação com a decisão da Câmara dos Deputados. Clique aqui para conferir.

Além disso, ao firmar a parceria com o CNJ e o Ministério da Justiça, que possibilitou a implementação do mecanismo em todas as capitais brasileiras, o IDDD comprometeu-se a monitorar a realização das audiências de custódia nos estados, avaliando seus resultados, coletando dados e sinalizando seu impacto no sistema de justiça criminal do país. Em São Paulo, esse monitoramento deu origem ao relatório “Monitoramento das Audiências de Custódia em São Paulo”, lançado em maio de 2016 e, para este ano, está previsto o lançamento de uma versão do estudo com dados nacionais, construído em conjunto com parceiros (organizações, faculdades e grupos de estudos) de nove unidades da federação.

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